Meu filho não vai ter um pai que salva vidas como eu tenho. Nem vai ter um pai que conhece mais gente da idade dele do que ele próprio, e periga ser mais amigo dos amigos dele do que ele. O pai do meu filho dificilmente vai ter paciência de levar sanduíches e coca-cola nos intervalos da gravação do CD da bandinha de garagem que ele montar, como o avô dele fez, mesmo não sendo um grande fã de música, especialmente aquela que fazíamos. Tenho certeza que se meu filho chegar bêbado em casa, cinco da madrugada, não vai ser recebido com o café da manhã na mesa, e com certeza apanha se vomitar no meu pé ao invés de receber um sorriso acolhedor como meus irmãos e eu recebíamos. Meu filho não vai ter um pai que acerta a colocação dele no vestibular, antes de qualquer resultado oficial, fazendo cálculos e mais cálculos estatísticos que ainda nem inventaram. Meu filho não vai ter um pai cujo maior prazer da vida é trancar a casa com todos dentro no final do dia, para sentir que a família ainda não se separou, nem que seja só por aquele instante. Não vai ter conforto nas frases repetidas, quando tudo o que se precisa é escutar o que já se sabe, da mesma maneira de sempre, para sentir-se em casa; pois sou bem mais complicado do que isso. Essas coisas eu não vou fazer, mas vou fazer outras, espero que suficientes para que meu filho tenha um dia vontade de contar para todos como somos grandes amigos.
Eu não sou exatamente um cara místico, que acredita muito em que tudo acontece por um motivo e tal. Ou pelo menos não era até ter meu filho e começar a me aproximar da meia idade. Agora, de verdade, meu velho ter perdido a hora no meu primeiro dia de aula em um novo colégio sempre fez meu ceticismo cair de joelhos, por assim dizer. Explico. Meu velho nunca perde a hora. Pelo contrário, a hora é que perde ele. Sempre agitado, ligadão, a mil por hora, quais eram as chances dele dormir demais no primeiro dia de aula de dois dos seus três filhos no colégio novo? Bom, alguma chance deveria ter, pois foi o que aconteceu. E esse pequeno deslize foi o que salvou a minha vida, sem exageros. Como cheguei atrasado, as carteiras próximas aos meus colegas do antigo colégio já estavam todas tomadas. Sobrou um lugar do outro lado da sala de aula, bem no meio de três figuras lendárias da cidade. Para um piá de prédio, patologicamente tímido, vindo de um colégio de filhinhos de papai, sentar no meio ...
Comentários
Não entendem
Mas você não entende seus pais
Você culpa seus pais por tudo
Isso é absurdo
São crianças como você
O que vc vai ser quando você crescer..."