Minhas unhas já cresceram outra vez, e lembro de tê-las cortado ainda ontem. Lembro bem porque ontem teve lasanha no almoço. Ou será que a lasanha foi anteontem? É verdade, ontem teve feijão. Agora me confundi se cortei as unhas no dia da lasanha ou no dia que fui no cinema com a Tati, que foi uns dois dias antes. Ou foi na semana passada? Semana passada nós fomos passar o final de semana na casa de meus pais, que foi um final de semana depois das eleições, e lembro bem que na semana das eleições não fomos ao cinema, pois eu queria assistir ao debate (inútil diga-se de passagem) na televisão. É isso, agora lembrei, um mês atrás foi a ultima vez que fomos ao cinema, uma semana antes das eleições, duas semanas antes de passarmos o final de semana na casa de meus pais, três semanas antes de comer lasanha no almoço, uma semana atrás. Nem sei mais quando cortei minhas unhas pela última vez, mas elas estão gigantes. Ou o mês é que encolheu?
O pai chegou em casa cedo naquele dia. O pequeno estava na sala, com alguns amigos que tinham vindo com ele do colégio para brincar de videogame. A mais velha estava no quarto, com alguns amigos que não tinham vindo com ela do colégio, batendo papos virtuais. A mãe estava no banho. O cachorro em todos os lugares. Chovia lá fora. Como as crianças já estavam cansando de matar monstros e fazer curvas impossíveis, o pai resolveu contar uma história. Atividade antiquada essa de contar histórias, com a TV desligada, onde já se viu. Mas não demorou muito para o pequeno e seus pequenos colegas vidrarem seus pequenos olhos no pai, mal respirando. Era sobre um ser que viveu aqui por essas paradas, há muito tempo. Um ser verdadeiramente iluminado. Apesar de não ser humano, era amigo de todos. Cada vez que ele aparecia para uma visita, nem que fosse breve, todos se alegravam. Ele inspirava planos, sonhos, música. Enquanto o pai contava, a filha mais velha se juntou à gangue. Ouviu o silêncio
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