Pular para o conteúdo principal

Sergio's


O guardanapo roxo, os talheres grossos e pesados, a taça de vinho imitando cristal, o saleiro com furos em S, o pequeno pote de queijo fresco ralado e o vasilhame de um azeite de oliva duvidável. Meu Deus, estou no Sergio’s. Fui longe desta vez. Estou só. Ah sim, a Ana está na casa da mãe dela. Acho que é a primeira vez que venho aqui sem a Ana. Tomara que não dê azar. Lembro-me da primeira vez que estivemos por aqui, no começo do namoro. Eu queria impressioná-la. Funcionou. Depois, viemos comemorar todas as grandes alegrias aqui. As grandes brigas terminaram aqui também, algumas começaram. Poucas. Soube que ela estava grávida exatamente nesta mesa. Contei para ela de todas as minhas promoções comendo o mesmo ravióli de mascarpone com azeitonas pretas do Sergio’s. Pensando bem, se tivessem uma câmera filmando esta mesa, teríamos um resumo bastante representativo da nossa vida juntos, tirando as cenas x-rated, obviamente. E que vida juntos tivemos. Nos conhecemos há muito mais tempo do que se supõe quando nos vêem juntos e já passamos por tudo, menos fome. Já fomos até presos juntos, por uma bobagem da Ana, que eu insisti em continuar. Tivemos nosso pequeno, a maior aventura de todas. A rolha do vinho com a data de hoje, o cantucci para adoçar a boca, o café expresso. Ah sim, Sergio’s.

Comentários

Maria Ercília disse…
Com certeza, o melhor!!

Postagens mais visitadas deste blog

Seagazer

Como ser humano assumida e eternamente perplexo com a grandeza e as maravilhas do oceano, sempre percebo quando estou diante de um semelhante. Nós, os Seagazers , somos facilmente reconhecíveis. É só prestar atenção aos braços largados ao lado do corpo (ou as mãos dadas atrás das costas, uma variação que, à exceção do físico prejudicado e do fato de não usarmos sungas vermelhas, pode faze-lo nos confundir com salva-vidas prontos para a ação), ao olhar fixo no horizonte oceânico, às pernas um pouco espaçadas e a uma leve inclinação a sair nadando até desaparecer. No meu caso específico – pois não sou um porta-voz da nossa espécie, ou algo do tipo – se tiver um par de fones brancos no ouvido, com, por exemplo, Stargazer (um tipo mais conhecido mas não menos esquisito de Gazer ) do Mother Love Bone tocando, ainda melhor. Pode ser também a Oceans do Pearl Jam . Hoje, curtindo o último dia de férias na praia, descobri um novo membro do nosso seleto grupo de lunáticos. Meu filho. Ele te...

O nome do longo hiato

Tenho agora algo em torno de doze leitores assíduos. É demais para a minha cabeça. Esse negócio está fugindo do controle. Antes eram apenas minha doce esposa, minha sogra, meu pai e meu irmão mais novo. Estava tudo sob controle. Agora que tem outros oito, me sinto na obrigação de justificar o longo hiato entre o último texto e este, e entre este e os próximos, que provavelmente será tão longo quanto. A justificativa tem seis meses, nove quilos, o primeiro dente e responde por filhão ou gorducho, só que deste último ele não gosta muito. Falando nele, vai aí uma dica de veterano para aqueles que tem filhos de cinco, quatro, três, dois ou um mês, mais conhecidos como calouros. Tudo o que te disseram sobre os nenéns - perceba, eu não disse quase tudo, ou muito do que, ou a maioria, eu disse TUDO - é mentira ou não se aplicará ao seu. Só para dar um exemplo, um colega de trabalho me disse categoricamente que as cólicas, quando existem, acabam como que num passe de mágica no exato momento ...

Despertadores

Eu não sou exatamente um cara místico, que acredita muito em que tudo acontece por um motivo e tal. Ou pelo menos não era até ter meu filho e começar a me aproximar da meia idade. Agora, de verdade, meu velho ter perdido a hora no meu primeiro dia de aula em um novo colégio sempre fez meu ceticismo cair de joelhos, por assim dizer. Explico. Meu velho nunca perde a hora. Pelo contrário, a hora é que perde ele. Sempre agitado, ligadão, a mil por hora, quais eram as chances dele dormir demais no primeiro dia de aula de dois dos seus três filhos no colégio novo? Bom, alguma chance deveria ter, pois foi o que aconteceu. E esse pequeno deslize foi o que salvou a minha vida, sem exageros. Como cheguei atrasado, as carteiras próximas aos meus colegas do antigo colégio já estavam todas tomadas. Sobrou um lugar do outro lado da sala de aula, bem no meio de três figuras lendárias da cidade. Para um piá de prédio, patologicamente tímido, vindo de um colégio de filhinhos de papai, sentar no meio ...