Numa viagem que fiz no início de 2008 a trabalho, fiquei hospedado em uma pequena cidade chamada La Bouille, na região metropolitana de Rouen, famosa capital da alta Normandia, no noroeste da França, onde Joana D'Arc foi queimada. La Bouille é uma pequena vila de 818 habitantes que contorna um pedaço do rio Sena. Como na França comer bem não tem absolutamente nada que ver com tamanho de cidade, La Bouille, como qualquer cidade francesa, grande ou pequena, tem restaurantes ótimos. Tive a sorte de ficar hospedado no hotel que tem o melhor deles, não só da cidade como de toda esta região que beira o rio. O restaurante tem o mesmo nome do hotel, La Belle Vue, mais do que justificado quando se abre as janelas de qualquer um de seus quartos.
A esta altura deve-se estar imaginando qual a ligação do título do nosso texto, Mediterrâneo, com esta experiência que tive em um restaurante do outro lado da França. Simples, eu explico. Sempre fiquei fascinado com o fato de não interessar o tamanho ou a riqueza da região, sempre se pode encontrar um bom restaurante na França e praticamente em qualquer país da Europa. Aqui no Brasil, não é difícil de perceber, a realidade é diferente. Se quiser comer bem, vá para uma capital. Aliás, escolha bem a capital, pois não é em qualquer uma que se pode encontrar um restaurante com a qualidade do Belle Vue. Esta era a realidade da minha cidade natal Ponta Grossa, no interior do Paraná, até ontem. Tive a sorte de estar na cidade no dia em que abriu o restaurante Mediterrâneo, com a cozinha capitaneada pelo chef Bruno Pellissari. O restaurante, que ocupa uma casa de esquina do bairro residencial mais nobre da cidade, dá um show de culinária contemporânea, mas sem esquisitices. O chef Bruno não é desses novos chefs que resolveu cozinhar porque não tinha coisa melhor para fazer. Tem a culinária no sangue, herdada desde que sua mãe o ensinou a fazer uma receita de macarrão com sardinha (o famoso Spaghetti con le Sarde da região de Palermo na Sicília), que aprendeu com o seu avô (bisavô do chef) e assim por diante. Aliás, esta é uma ausência notada no cardápio do Mediterrâneo, e que daria ainda mais força ao nome escolhido para o restaurante, uma vez que a região da receita original é completamente circundada pelo mar que batiza este charmoso local.
Com ambiente intimista e agradável, logo ao entrar no restaurante você sente que foi teletransportado para uma cidade qualquer do outro lado do Atlântico. Entradas como o espetinho de queijo brie e pêra, ou a terrina de frango com molho de laranja, já dão a dica do espetáculo gastronômico que se está prestes a assistir. Como pratos principais de destaque, o confit de canard repousado em polenta, o mignon com crosta de farofa de funghi e o conchiglioni recheado com cordeiro e figos devem conquistar mesmo os menos acostumados com a cozinha moderna. A carta de vinhos impressiona, não pela variedade insana ou pelos exemplares milionários comumente encontrados em casas da moda, mas pela simplicidade e pelo preço mais do que justo de suas garrafas, que acompanham muito bem os diversos pratos da lista.
É como se a sua avó italiana tivesse resolvido ousar um pouco e, ao invés de fazer o macarrão com molho vermelho de sempre, tivesse pedido para você baixar umas receitas novas na internet e, ao invés de servir o vinho do nono, tivesse te dado um dinheirinho (não muito) para comprar uma boa garrafa na importadora da esquina. Em épocas de crise, com as viagens a trabalho rareando, sempre que tiver saudades do Belle Vue, vou dar uma parada no Mediterrâneo.
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